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230 – O Ódio (La Haine) – França (1995)

Direção: Mathieu Kassovitz
Roteiro: Mathieu Kassovitz
A história de Vinz, Hubert e Said, três imigrantes tentando sobreviver numa Paris banhada pelo sangue dos conflitos raciais. O filme acompanha os três no dia que se segue a um violento embate entre policiais e imigrantes. Prêmio de melhor direção em Cannes.

O filme mostra um dia de três jovens imigrantes, moradores de um bairro periférico de Paris. Segregados do “lado A” parisiense, eles vagam pela rua, cometendo pequenos delitos que, de certa forma, lhe fazem gozar de alguns privilégios que não possuem: roubam um carro para voltar para casa, levam o cartão de crédito de um homem distraído, entram em uma galeria para comer e beber de graça, vendem um baseado para conseguir grana.
Os três personagens possuem perfis comuns: têm a imaturidade de um jovem e uma agressividade no comportamento, embora uns tenham mais e outros menos tais características. E, assim como eles, a periferia vive em um clima tenso com a polícia. Eles dominam os espaços sem respeitar o policiamento que está lá “para cumprir as leis”. E ai do policial que queira usar da violência para manter a ordem, pois isso resultaria em uma reação ainda mais violenta dos civis e a periferia explodiria.
O clima de um confronto eminente é tratado, no filme, de forma comparativa com uma piada: um homem se joga do quadragésimo andar; no meio da queda ele se arrepende, mas, para se conformar diz para si mesmo, a cada andar que ele passa: até aqui tá tudo bem, até aqui tá tudo bem, até aqui tá tudo bem. O problema, no entanto, não é a queda, mas a aterrissagem.
Recentemente a França “ganhou” mais alguns andares de queda, evitando assim, uma aterrissagem fatal. O povo francês, ao eleger François Hollande e rejeitar Sarkozy e Marine Le Pen, deu mais uma chance à política de imigração. Os dois últimos são defensores de políticas rigorosas para reduzir a entrada de imigrantes e possuem um discurso xenofóbico, que estigmatiza e até interfere na liberdade individual dos cidadãos que possuem uma cultura não-francesa.
Durante o processo eleitoral, um dos assessores de Sarkozy chegou a dizer: “Se construímos a Europa foi para nos proteger, não para deixar que nossa identidade e nossa civilização fossem destruídas”.
Bem, para discutir essa lógica é preciso recorrer a duas coisinhas básicas, que qualquer adolescente já teve em suas mãos: um livro de história e um jogo de tabuleiro War.


Eis que lá por volta de 1800 e algumas décadas, os líderes políticos europeus, da França, Itália, Inglaterra, Alemanha, Espanha, etc. se sentaram em uma mesa, escolheram os seus peões, retiraram suas cartas e lançaram seus dados. O objetivo que caiu para a França foi: invadir a África e conquistar matérias-primas para abastecer a sua produção industrial, novos mercados para consumir seus excedente, e territórios para desafogar seu crescimento populacional.
Resultado: França 3×2 Argélia, 3×0 Tunísia, 3×1 África Ocidental, 3×1 África Equatorial, 3×0 Somália, 3×0 Madagascar. Objetivo conquistado!
Nem precisa dizer os efeitos que a partilha européia na África causou, já que até hoje vemos um continente miserável, enfraquecido e sob efeitos de guerras civis. Mas, para resumir o que foi feito, se utilizando das palavras do assessor de Sarkozy, a França destruiu “a identidade e a civilização” de países e etnias africanas.
E, ao longo dos séculos que se sucederam, o continente acabou, inevitavelmente, expulsando seus filhos, que partiram para a Europa. Não para reconquistar territórios. Mas, para lavar pratos, jogar futebol, varrer ruas, enfim, sobreviver – até porque, manter-se vivo já seria uma conquista.
E, pode-se dizer que quando o primeiro francês invadiu a África, e, depois, a Europa invadiu países do Oriente Médio, o homem se jogou do quadragésimo andar e, desde então, vem caindo. Mas, até aqui tá bom.
Como O Ódio já previa 10 anos antes, em 2005 veio a aterrissagem. Após uma perseguição banal feita por policiais, atrás de jovens imigrantes da periferia parisiense, dois deles morreram acidentalmente. Pronto, foi o que precisava para o caldeirão transbordar. Clichy-Sous-Bois explodiu e Paris viveu dias de intensos confrontos entre a polícia e seus moradores.
O Ódio, portanto, não poderia ser tão profético!
Vídeos altamente recomendados:
Uma visita deRegina Casé à Clichy-Sous-Bois.
E o documentário feito por um morador, durante os conflitos de 2005 e anos que se sucederam: 365 jours a Clichy-Montfermeil (áudio em francês, sem legenda) – parte 1 / parte 2 / parte 3.

Minha Nota: 8,4
IMDB: 8,1
ePipoca: 5,3

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